quarta-feira, maio 13, 2009

Almoço grátis (Geraldo agradece)

geraldo apavorado em seus dias
de inexorável solidão (ausente
dos ávidos clamores de quem não sente
o gume e a fome das manhãs tão frias)

já não destila mais filosofias
(e era ele um orador ardente):
agora vai de encontro à sopa quente
rejeitando lagartas e arrelias.

a idade (diz geraldo) não perdoa
(diz ele que muito na vida amou
a cátedra: e diz que amou à toa

porque no desemprego se finou).
a sopa sorve. agradece a lisboa
a caridade que hoje lhe doou.

A sopa dos pobres (e mal agradecidos)

se não comes a sopa toda
és um mau comedor de sopa.
se ainda vens com a mesma roupa
com que ontem comeste uma açorda

ou muito te agradou a boda
ou só terás mais roupa rota
ou fazes isso por chacota.
mas lá que a sopa sobra sobra.

terça-feira, maio 12, 2009

Apenas 29 versos mais um

canso-me de ti
mas nunca me agravo
só com o que vi:
eu quero mais largo
saber do que sei
e do que não fui
do que não cuidei
e do que senti
por dentro de mim
por fora de ti.
o que em mim influi
não são as marés
dos olhares trocados
nem o signo atento
do meu desalento.
o que em mim influi
sou apenas eu
brincando com meu
fazedor de rimas
airosas e finas.
mas isso é mentira:
se fora verdade
o que em mim influi
(ainda que fira
a minha vaidade)
seria saudade
do que não senti
por fora de mim
por dentro de ti

(daquilo que és).

Soubera eu cantar

estas paisagens há muito habitadas
por sucessivas gerações de servos
da impávida ternura e seus erros
soubera eu cantá-las.

soubera eu lembrar as vozes sábias
dos que aqui labutaram em seus nervos
seus músculos seu sangue seus segredos
soubera eu louvá-las.

mas eu não canto: eu alinho versos.